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Criar em tempos de dor, medo e incerteza

Quando tudo começou a mudar por aqui eu paralisei. Foi impossível criar, eu não conseguia nem sequer ter ideias. Tudo tão incerto, tantas perguntas, muitas que nem foram respondidas ainda. E eu ficava indo de uma a outra, ler notícia, ler estudos, coletando informações de como sair, como higienizar tudo. Pra mim, parecia banal eu sentar aqui, pegar as linhas, um bastidor e deixar um pedaço de cor no mundo.

Além das questões do mundo, da pandemia, vinham questões pessoais, profissionais. Como aguentar em casa sem previsão de fim da quarentena. Como fazer as coisas tradicionais da vida. Como encontrar entretenimento. Como vender? Vou conseguir vender? PUF! Quando cheguei nessa pergunta fiquei com ela, tomei como verdade que ninguém ia comprar um bordado, seja ele qual for, nesse momento. Tinha absoluta certeza de que não venderia. Aí me sabotei mais. Desanimei. Quis abandonar essa história toda. Comecei a me comparar com tantos artistas produzindo e conseguindo vender. Bola de neve!

Então virei a chave. Decidi sair daquele buraco do medo, comecei a mexer um dedo, fui me alongando, dei um passo, outro, mudei meu pensamento e o criar foi cada vez mais natural. Fui voltando.

Entrar nesse buraco do medo e ficar paralisada é sombrio, frio e enlouquecedor. E com o tempo eu vi que estava perdendo um tempo precioso ali travada. Poderia sim deixar cores no mundo, bordar o que deixa mais bonito, encontrar respostas pra algumas das minhas perguntas, encontrar outras perguntas. Se o mundo foi ficando preto e branco, cabe a nós, artistas ir voltando a cor. Em forma de arte, em forma de protesto, de mensagem, de música, de dança.

Ninguém vai passar por isso ou qualquer outro desafio da vida sem a arte. Seja uma série na TV que acalma, uma música que faz chorar e liberar tantas lágrimas paradas, comprar arte para decorar a casa e fazer lar, uma outra música que faz parar tudo para fechar os olhos e começar a dançar. E se um tempo atrás eu aceitei o desafio de vir para o lado da arte, de produzir o belo para enfeitar o outro, preciso fazer a minha parte.

Produzir em tempos sombrios é resistir a escuridão. É dar luz e cor à escuridão do outro.

Por um tempo entrei junto na escuridão, me deixei ir, mas tem algum tempo que decidi ser luz, ser girassol, sair do casulo e virar borboleta. Qual analogia para você aqui fizer mais sentido. Pra mim, a borboleta é perfeita, pelo simples fato de que é impossível não sorrir quando vemos uma voando por aí, pousada em uma flor no movimento leve das suas asas. Eu quero fazer sorrir no movimento leve dos meus fios.

E termino esse texto pensando na cena da animação Trolls, quando todos desanimam e ficam cinza, um começa a cantar e traz de volta esperança e aos poucos todos retomam cor. A arte é isso, a cor vai espalhando, vai reativando a esperança em ondas.

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